terça-feira, 15 de dezembro de 2009

A Crónica do Pai Natal

De facto nos dias de hoje, quem não se pergunta qual a melhor maneira de dizer a uma criança que não existe o Pai Natal?

Depois de tantos anos de farsa, de tentar meter os filhos na cama, para poder por os presentes ao pé da árvore e dizer que foi o pai natal, há um dia normalmente no decurso da época natalícia, em que a criança na sua infinita ingenuidade pergunta se é verdade que o Pai Natal não existe.
O pai sempre atónito com a velocidade a que a sua prole cresce interroga-se sobre como dizer ao filho que lhe mentiu durante toda a sua vida, sobre o que não é mais que um mito ou uma lenda na opinião de qualquer adulto respeitável e minimamente bom do juízo.

É na maioria dos casos a primeira grande mentira que se revela, e se deixa de poder camuflar entre a ingenuidade sempre diminuta da criança dos dias de hoje.
Na altura, como me recordo, é sempre um grande choque.
Primeiro o nosso herói de infância, alma generosa e honesta como sempre diz ser, capaz aos nossos olhos de erguer qualquer peso no mundo, é nos mostrada como nada mais que um mentiroso, que mentiu por uma razão que nunca fica bem clara.

E a seguir a pessoa que supostamente distribui os presentes por toda a miudagem durante uma só noite e que se acredita que faz milagres e porventura pratica a “magia do natal” é nos descrita como nada mais que um mito, ou a lenda de um santo que existiu a muito tempo atrás e cujo legado o persegue até aos dias de hoje.

Aí nesse pequeno momento singular na vida de qualquer um, raramente recordado depois de chegar a adolescência, perde-se uma faísca daquela inocência pura da idade, a qual se passa uma vida inteira a procurar sem nada achar.

Para os observadores mais minuciosos e dados ao sentimento é possível notar que algo muda no olhar da criança quando percebe que o rumor que alguma outra criança lhe contou é nada mais nada menos que a verdade e que seus pais e restantes educadores foram as pessoas que lhe mentiram o tempo todo.

Depois de assistir a uma discussão entre duas crianças sobre se de facto o Pai Natal existia, reparei numa coisa ao qual me resignava a acreditar, ao ver a fervência com que aquela simples criança ignorante de todas as verdades da vida defendia a existência do um ser que nunca vira, nunca ouvira, nem nunca falara, e a única prova que tinha eram os presentes que apareciam, e as bolacha e o leite que deixava amavelmente, e que eram comidas.

O outro lá refutava que isso podia ser qualquer um, muito provavelmente os pais da menina em questão.

Lá pela lógica os ateus têm quase sempre razão, mas é também verdade da vida que pela lógica não se rege o mundo.

E assim, olhando como quem vê, finalmente me apercebi, que o Pai Natal realmente existe.

Existe?! Mas existe como? Estarei eu perder a capacidade de pensar?

Acho que nos dias de hoje, muita pouca gente iria aceitar se dissesse que está apenas para lá da nossa compreensão.

Mas de facto está para lá da compreensão de muita gente…

O pai natal existe como gesto, gesto altruísta da noite de natal onde até os pais egocêntricos conseguem dividir a gratidão dos filhos com outro, onde os pais castigados pela vida, fatigados e cansados compram o que podem e o que não podem apenas para ver um sorriso mais na cara do filho e ainda atribuem o seu gesto louvável a um santo que se desconhece. Como palavras pronunciadas por até quem não acredita enunciando um velhote de cara simpática e barriga cheia, barbas brancas de bondade que distribui prendas fabricadas em fabricas extenuadas de duendes mágicos e trabalhadores.

Existe como perpetuação de um mito com mais anos do que aqueles que a vida conta, que mais pessoas conhecem do que aquelas que existem, que tantos sorrisos rende tal que nem qual o que uma prenda contêm.

Existe como ingenuidade de criança, como força de acreditar, de esperança, como olhar que não cansa, como fé que não dúvida.
Como marca de eterna validade, que promete aquilo que ninguém pode, que alarga sorrisos e estende felicidade.

Quem se atreve a duvidar de aquilo que a criança apregoa com mais fé que muito padre, e sem questionar uma palavra que pronuncia.